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Questões regulatórias sobre Bioimpressão 3D

A bioimpressão traz novas oportunidades para a engenharia de tecidos e outros setores. Atualmente, um dos principais obstáculos tecnológicos à translação clínica da bioimpressão é o desenvolvimento de biotintas eficazes e o desafio central é garantir que as células sobrevivam ao processo de impressão. Outros requisitos incluem o controle da proliferação, viabilidade celular durante e pós-impressão e que alcance uma vascularização. Alguns desses problemas são comuns à engenharia de tecidos usando métodos tradicionais, mas outros são mais novos. As restrições tecnológicas continuam a apresentar inúmeras dificuldades, tornando a aplicação clínica da bioimpressão um pouco distante da realização.


Fonte própria: Imagem esquemática da Bioedtech


Avanços no processo regulatório podem incentivar significativamente o amadurecimento de pesquisas e a comercialização de novos produtos que usam a tecnolgoia de bioimpressão 3D. E organizações governamentais devem promover avanços em tecnologias fundamentais que fazem parte das tecnologias de fronteira como a bioimpressão e potencialmente apoiar investimentos iniciais neste campo. Eles podem ajudar a demonstrar a utilidade e disseminar o uso desta tecnologia emergente em uma variedade de comunidades, incluindo academia, governo, reguladores, ONGs e indústria.


A engenharia de tecidos é um campo multidisciplinar em evolução com tecnologias de ponta e percepções científicas inovadoras que prometem a regeneração funcional de tecidos/órgãos danificados. Os produtos médicos de engenharia tecidual - PMETs (TEMPs em inglês) são produtos de biomateriais e células que é injetada, implantada ou aplicada topicamente no decorrer de um procedimento terapêutico ou de diagnóstico. As estratégias atuais de engenharia de tecidos visam a impressão/bioimpressão 3D que usa células e polímeros para construir tecidos/órgãos vivos camada por camada com alta precisão 3D.

No entanto, ao contrário de medicamentos ou terapias convencionais, TEMPs e tecidos bioimpressos em 3D são novas terapêuticas e precisam de diferentes protocolos regulatórios para ensaios clínicos e processos de comercialização.

Fonte própria: Imagem esquemática da Bioedtech


De acordo com algumas matérias, para iniciar uma breve discussão sobre regulamentação de tecidos e órgãos bioimpressos, precisamos saber qual a classificação de um "bioproduto" bioimpresso, pois um órgão bioimpresso que poderá ser usado para transplante não é inteiramente comparável a um único procedimento ou dispositivo atualmente regulamentado, como medicamentos, produtos biológicos e dispositivos médicos.

Um órgão humano se desenvolve em um organismo vivo em estágios do desenvolvimento, isso não descreve com precisão um órgão biofabricado, que seria cultivado a partir de uma biotinta (células, biomateriais e fatores indutivos) manipulados para produzir um tecido/órgão completamente novo. Além disso, o processo de transplante de órgão bioimpresso também seria muito menos invasivo, sem efeito negativo significativo sobre o doador (levando em consideração que o doador de células será o próprio paciente). Essa diferença também sugere que órgãos bioimpressos em 3D podem ser tratados de outra maneira.


Sob uma perspectiva diferente, um órgão bioimpresso "poderia" ser regulado comparando-o com um medicamento. Embora pareça estranho associar um órgão a um medicamento, o uso pretendido do órgão bioimpresso corresponde ao de um medicamento - como isso:

  1. Se um medicamento é usado para permitir que uma pessoa tenha um padrão de vida melhor ou cure completamente a doença, esse seria o objetivo de um órgão bioimpresso.

  2. Também foi proposto que os órgãos bioimpressos deveriam ser regulamentados como um “produto biológico”, sendo esses produtos definidos como “vírus, soro terapêutico, toxina, antitoxina, vacina, sangue, componente ou derivado do sangue, produto alergênico, proteína ou produto análogo. . . aplicável à prevenção, tratamento ou cura de uma doença ou condição humana". A partir desta lista, o termo proteína pode ser considerado para a comparação: Para imprimir células humanas e permitir que elas se transformem em um órgão bioimpresso transplantável, são utilizados matrizes/hidrogéis e meios de cultura que conterão proteínas. Assim, pode parecer lógico que esses órgãos bioimpressos se enquadrem no escopo de produtos biológicos.

  3. Por outro lado, os órgãos bioimpressos não poderiam ser regulados como um dispositivo médico, pois o órgão teria uma ação química no corpo humano com a intenção de substituir um órgão com defeito.  Os dispositivos médicos geralmente não são feitos de material biológico, podem ser implantes de metal, plástico ou dispositivos que ajudam na recuperação ou no padrão de vida de uma pessoa. 

Parece que os órgãos bioimpressos podem ser cobertos por várias regulamentações devido à complexidade das aplicações para os quais podem ser utilizados. E, embora a estrutura regulatória existente não possa prever uma tecnologia tão disruptiva, parece que existe a base para uma estrutura de suporte à bioimpressão 3D.

Como a própria tecnologia de bioimpressão de órgãos, na qual muito pouco é instintivo, sua regulamentação será igualmente complexa.  Os órgãos regulatórios poderiam compilar um novo regulamento para cobrir o uso de tecidos/órgãos bioimpressos se essa tecnologia se transformar em um procedimento amplamente rotineiro ou poderá ser coberto por um ou mais regulamentos já em vigor.

Como a indústria procura abordar os desafios científicos associados à progressão da bioimpressão de tecidos e órgãos no laboratório, também deve começar a abordar essas questões regulatórias para quando a teoria se tornar realidade. Ainda não temos tecidos e órgãos bioimpressos totalmente funcionais, reprodutíveis e confiáveis. 



Fonte própria: Imagem esquemática da Bioedtech


Vamos olhar para os produtos que já são comercializados no mundo e que se aproximam dos produtos que queremos discutir aqui:


Produtos de que usam engenharia tecidual, mas não bioimpressão.


Fonte: tabela adaptada de Sekar et al.


Agora compartilhamos uma tabela de P&D de alguns tecidos/órgãos 3D biofabricados usando diferentes estratégias de bioimpressão para aplicação em regeneração de tecidos.

Fonte: tabela adaptada de Sekar et al.


No Brasil, algumas matérias e discussões já começaram a trazer a questão da regulamentação da técnica.


A startup Quantis tem uma jornada, já iniciada, de colocar colágeno humano animal-free biofabricado com a tecnologia de bioimpressão no mercado de estética e medicina regenerativa nos próximos anos. Porém, é um produto acelular, apenas proteínas extraídas a partir de tecidos 3D bioimpressos.


A startup In Situ que desenvolveu um biocurativo durável a partir de células-tronco e bioimpressão que não possui rejeição. A In Situ pretende ver seu biocurativo sendo usado no Sistema Único de Saúde (SUS) e a expectativa é que o curativo chegue ao mercado nos próximos anos com um valor de aproximadamente R$ 8.500.


O Hospital Nove de Julho informou que a equipe utiliza a bioimpressora 4D para deposição de células do paciente da marca Rokit healthcare que foi aprovada para uso comercial no Brasil em julho de 2022 pela Anvisa. (informação encontrada em matérias públicas, mas não encontramos o registro da aprovação para trazer mais detalhes).

O dispositivo tem como proposta tratar lesões de pele causadas por queimaduras, câncer e úlceras, por exemplo. Isso acontece por meio de um curativo biológico feito a partir de células-tronco retiradas da região abdominal do paciente. É pertinente ressaltar que a "biotinta" da impressora é constituída por um material autólogo, ou seja, do próprio paciente. Dessa forma, o risco de rejeição ao enxerto é significativamente menor do que seria para outro tipo de material. Fonte: https://revistagalileu.globo.com/Tecnologia/noticia/2022/08/bioimpressora-que-fabrica-curativo-com-celulas-tronco-chega-ao-brasil.html


Sobre clinical trials - em andamento - nós encontramos 3 projetos, demonstrados em uma tabela abaixo. Fonte: https://clinicaltrials.gov/ct2/results?cond=&term=bioprinting&cntry=&state=&city=&dist=


Grandes empresas de saúde seguiram a tendência e estabeleceram colaborações com empresas de bioimpressão. Por exemplo, a AstraZeneca estabeleceu o BioVentureHub, que fornece a empresas emergentes de ciências da vida e equipes acadêmicas acesso à experiência e infraestrutura da AstraZeneca. A CELLINK, líder global em bioimpressão, já estabeleceu um laboratório de P&D no BioVentureHub para biofabricar modelos de tecidos de rim, coração, fígado e pulmão para desenvolvimento farmacêutico. Da mesma forma, a Johnson & Johnson anunciou a criação de um laboratório de pesquisa em bioimpressão como parte do 3D Printing Centre of Excellence em colaboração com o Advanced Materials and BioEngineering Research (AMBER) Institute em Dublin. Astellas Pharma, Bristol-Meyers Squibb, Merck, Novartis, Procter and Gamble, A Roche também tem programas de bioimpressão, assim como algumas grandes instalações de pesquisa em todo o mundo, como os Institutos Nacionais de Saúde (NIH) nos EUA. Na Austrália, apesar da falta de grandes empresas farmacêuticas nacionais, tem havido um foco em tecnologias emergentes de bioimpressão, com vários centros apoiados pelo governo (ou seja, o ARC Training Centre em Wollongong, NSW, o ARC Centre of Excellence for Electromaterial Science) .


E no Brasil?

Temos algumas pequenas iniciativas ocorrendo entre startups e indústrias (diversas), mas nenhuma organizada ao ponto de ter um programa único focado em P&D em Bioimpressão. E precisamos incentivar a grandiosidade de redes funcionais e saudáveis no nosso país, o mais rápido.


Esquema de comunicação das partes mais interessadas . Esquema mostrando os principais papéis e como o fluxo de informações e os relacionamentos contribuem para o desenvolvimento de novos modelos. Fonte: artigo


Embora a impressão 3D de órgãos esteja chegando, os formuladores de políticas em todo o mundo carecem das informações necessárias para tomar decisões regulatórias nesse espaço. Diferentes países têm abordagens diferentes, mas muitas das nações líderes em 3DP compartilham preocupações semelhantes. Com mais informações, os reguladores terão que decidir se as estruturas regulatórias existentes podem abordar adequadamente as preocupações de segurança dos órgãos impressos em 3D.



Matéria escrita por: Janaina Dernowsek, empreendedora e pesquisadora em Bioimpressão 3D e Genética. Fundadora e Diretora de inovação da BioEdTech Cofundadora e CEO da Quantis. Professora no MBA em Health tech da FIAP.


Referências principais utilizadas na matéria:


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