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Foto do escritorLetícia Charelli

Cultivo celular em 3D: Conceito, Aplicações e métodos de produção

Embora o cultivo tradicional em monocamada (2D) tenha favorecido o entendimento de diversos eventos biológicos, este tipo de cultivo celular possui determinadas limitações, que resultam no fraco mimetismo com o sistema fisiológico humano.


Nesse tipo de cultivo, as células possuem a morfologia bidimensional, onde as interações que prevalecem são entre célula-plástico da garrafa/placa de cultivo, o que não é similar, quando comparado com os nossos tecidos/órgãos. Como consequência, características da biologia celular, como a produção de proteínas, a expressão de genes importantes e a atividade metabólica são pouco miméticas ao que de fato ocorre in vivo (Fig 1).

Ao entender esse cenário, novas técnicas de cultivo celular passaram a ser introduzidas e recomendadas, a fim de produzir sistemas in vitro que fossem fisiologicamente mais relevantes. É dentro desse contexto que o cultivo celular em 3D ressurge. Apesar de ter sido descrito primeiramente em 1944, pelo embriologista Johannes Holtfreter, o cultivo 3D ganhou destaque no cenário mundial nas últimas duas décadas. Dentre os fatores que impulsionaram a forte retomada desse tipo de cultivo em 3D (além da necessidade de modelos in vitro mais preditivos), estão as técnicas de visualização mais aprimoradas, como os kits comerciais de fluorescência com maior poder de penetração, assim como as técnicas de microscopia.


O cultivo 3D, livre de arcabouço, é uma estratégia de cultivo celular onde as células podem ser guiadas a se organizarem em uma estrutura esferoidal, de forma mais “natural”, sem aderirem à uma superfície ou precisarem ser encapsuladas

Neste sistema de cultivo, as interações que prevalecem são entre célula-célula e célula-matriz extracelular. A arquitetura 3D assumida pelas células, suas matrizes e bioprodutos secretados por elas, gera um microambiente dinâmico, que melhor se assemelha com a biologia dos tecidos in vivo (Fig 2).


Comparações entre o cultivo em 3D e 2D mostram que, as células dispostas em 3D possuem maior estabilidade gênica e de morfologia, maior viabilidade, melhor capacidade de diferenciação em outros tipos de tecido, atividade metabólica mais similar com o in vivo, assim como podem ser cultivadas em longas cinéticas (superior a 3 meses!). A alta densidade de células e de matriz extracelular, também favorece a criação de uma barreira biológica, que protege as células internas de danos exógenos.


Devido a todas essas vantagens, o cultivo de células em 3D tem sido amplamente utilizado para diferentes finalidades: Como blocos de construção na engenharia tecidual, na modelagem de doenças, no estudo de biologia básica, na toxicologia, assim como para a triagem de fármacos (Fig 3). Na medicina personalizada, o uso do cultivo 3D também agrega muitas vantagens, uma vez que poucas células do paciente podem ser retiradas, cultivadas em 3D e uma triagem de fámarcos específicos podem ser realizada. Resultando em efeitos colaterais menores e maior especificidade, impactando na qualidade de vida do paciente.


Por serem altamente vantajosos, o cultivo em 3D já é uma realidade clínica! A empresa alemã Codon foi a pioneira na Europa a realizar ensaios clínicos utilizando condroesferas (esferoides compostos de células da cartilagem do próprio paciente) e, desde 2017, essas condroesferas já são comercializadas como bioprodutos terapêuticos.

Principais formas de produção

O cultivo 3D, livre de arcabouço, pode ser produzido de diferentes formas, aplicando ou não forças externas para a sua formação. Quando uma força externa é aplicada, o construído pode ser denominado de agregado celular. Quando nenhuma força externa é aplicada, podem ser chamados de esferoides celulares.


A ausência de forças externas, permite a produção de construídos mais homogêneos em forma e tamanho, além de diminuir o estresse por cisalhamento que as células expostas a forças sofrem, tornando estas tecnologias passíveis de padronização e produção em larga escala, diferentemente do observado para os agregados celulares

Para a formação dos esferoides, as principais técnicas são; o micromolde não aderente, a gota pendente e a microfluídica.


- MICROMOLDE NÃO ADERENTE

A formação de esferoides utilizando hidrogéis micromoldados tem como conceito a semeadura de células em hidrogéis não aderentes, como a agarose por exemplo, onde, através da força gravitacional, as células irão sedimentar nas micro ressecções. Por serem incapazes de aderir ao hidrogel, as células interagem entre si, primeiramente por interações célula-célula e posteriormente por ligações com a matriz extracelular produzida por elas.


Esta metodologia é promissora e amplamente aceita pois é passível de escalonamento e produção em larga escala, pouco laboriosa e de fácil manutenção. Ademais, os esferoides podem ser facilmente coletados para diferentes análises, assim como são produzidos com um alto grau de homogeneidade de forma e tamanho (Fig 6-A).

Sabendo de todas as vantagens que o cultivo de esferoides celulares apresentam, a Bioedtech desenvolveu um sistema de micropinos (BIODEVICES3D) que permite a produção em larga escala, e em tempo hábil, dos esferoides. Esse sistema é de fácil manipulação e esterilização, podendo ser reutilizado inúmeras vezes. E o melhor de tudo? Com excelente custo-benefício (Figura 5).


- GOTA PENDENTE

Nesta estratégia, os esferoides também se formam através da força gravitacional. Há a semeadura da suspensão celular na parte interna da tampa de uma placa de cultura, que será invertida, e as gotas permanecerão ligadas a tampa, devido a tensão superficial do líquido. Embora plataformas automatizadas tenham sido desenvolvidas para otimizar este tipo de cultivo, a manutenção do mesmo ainda pode ser laboriosa e de difícil escalonamento (Fig 6-B).


- MICROFLUÍDICA

Ao utilizar dispositivos microfluídicos, as células são escoadas através de uma rede de microcanais, para o interior de microcâmaras, onde são posicionadas e expostas a um fluxo contínuo de meio, culminando na aproximação gradual das células e sua posterior automontagem. Estes dispositivos microfluídicos permitem a produção em larga escala, o monitoramento e controle em tempo real do cultivo. Por não serem um cultivo estático, garantem a perfusão de nutrientes/fatores solúveis e saídas de metabólitos acumulados no cultivo. Entretanto, ainda há dificuldades de produzir esferoides com diâmetros e formas tão controlados quanto na técnica de micromoldes não aderentes (Fig 6-E).


Para a formação dos agregados, as principais técnicas são; a cultura de pellet e o cultivo em frascos rotatórios.


- PELLET CELULAR

Consiste na fabricação de agregados celulares por meio da centrifugação. Ao submeter o tubo contendo a suspensão de células a uma determinada rotação e tempo, têm-se como produto um agregado celular em 3D. Esta metodologia apresenta limitações, como a dificuldade de automatização, e possíveis danos as células, devido a força causada pela centrifugação (Fig 6-F).


- FRASCOS ROTATÓRIOS

O cultivo em frascos rotatórios, promove a formação de agregados através de colisões entre célula-célula em frascos contendo um sistema de rotação. A vantagem consiste na perfusão de meio que é capaz de alcançar os agregados em toda sua extensão, entretanto, este método não é indicado para células sensíveis a força de cisalhamento e sensíveis a apoptose (morte celular) caso sejam cultivadas em suspensão. Devido ao constante movimento, não é possível visualizar a formação dos agregados, assim como não é possível o total controle do tamanho dos mesmos (Fig 6-C, D).


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Referências

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BECHER, Christoph; LAUTE, Volker; FICKERT, Stefan; ZINSER, Wolfgang; NIEMEYER, Philipp; JOHN, Thilo; DIEHL, Peter; KOLOMBE, Thomas; SIEBOLD, Rainer; FAY, Jakob. Safety of three different product doses in autologous chondrocyte implantation: results of a prospective, randomised, controlled trial. Journal Of Orthopaedic Surgery And Research, [S.L.], v. 12, n. 1, p. 1-13, 12 maio 2017. Springer Science and Business Media LLC. http://dx.doi.org/10.1186/s13018-017-0570-7.


HOLTFRETER, Johannes. A study of the mechanics of gastrulation. Journal Of

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KIM, Se‐Jeong; KIM, Eun Mi; YAMAMOTO, Masaya; PARK, Hansoo; SHIN, Heungsoo. Engineering Multi‐Cellular Spheroids for Tissue Engineering and Regenerative Medicine. Advanced Healthcare Materials, [S.L.], v. 9, n. 23, p. 2000608, 30 jul. 2020. Wiley. http://dx.doi.org/10.1002/adhm.202000608.


LASCHKE, Matthias W.; MENGER, Michael D.. Life is 3D: boosting spheroid function for tissue engineering. Trends In Biotechnology, [S.L.], v. 35, n. 2, p. 133-144, fev. 2017. Elsevier BV. http://dx.doi.org/10.1016/j.tibtech.2016.08.004.

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