O reparo de lesões craniofaciais é uma tarefa árdua para os cirurgiões. A anatomia dessa região é heterogênea, sendo composta tanto de tecidos duros (hard tissues), tecidos moles (soft tissues) quanto de intensa vascularização. Além da dificuldade técnica em restaurar essa anatomia, o apelo estético associado a essa região também deve ser levado em consideração pelos profissionais.
Dentre as estratégias atuais, para o reparo dessas lesões , estão o uso de aloenxertos (tecidos derivados de um doador), autoenxertos (tecido retirado do próprio paciente) e o uso de biomateriais. No entanto, limitações como; infecções, respostas imunes descontroladas, pouca disponibilidade de tecido (no caso de autoenxerto) e dificuldade de controlar a interface entre biomateriais e tecido, ainda são presentes e impactam diretamente na qualidade do procedimento.
Em uma tentativa de reverter essa realidade, um time multidisciplinar de pesquisadores desenvolveu um método onde seria possível reparar todo o defeito, do osso até a epiderme, em um único passo, utilizando para isso a Bioimpressão intraoperatória
Bioimpressão intraoperatória
Também conhecida como in situ ou in vivo bioprinting, essa estratégia de Bioimpressão é promissora e tem ganhado repercussão. Com ela seria possível (i) digitalizar as informações da lesão, através de um scanner, (ii) e logo em seguida já depositar as células e os biomateriais específicos diretamente na lesão do paciente, utilizando para isso uma Bioimpressora. Essa entrega personalizada tem Diversas vantagens, como por exemplo melhorar a precisão e a eficiência do reparo tecidual.
Como funcionou a técnica dos pesquisadores?
A primeira etapa foi o desenvolvimento de uma biotinta específica para o reparo ósseo. Denominada de hard tissue-ink (tinta para tecido duro), essa biotinta compunha; colágeno, quitosana, nano-hidroxiapatita, β-glicerolfosfato e células-tronco mesenquimais.
Quando em temperatura ambiente, essa biotinta consegue ser extrudada. No entanto, quando aplicada em um paciente, a sua temperatura corporal aquece a biotinta, instigando a sua reticulação física, sem a necessidade de reticulação por luz UV ou alterações químicas.
A segunda etapa, consistiu no reparo da camada epidérmica. Para isso, foi utilizada a Bioimpressão por gotas, depositando camadas alternadas de soft tissue-ink (tinta para tecido mole), composta de colágeno, fribrinogênio, fatores de crescimento e fibroblastos (Fig 1).
Para testar a eficácia da técnica, camundongos com defeitos críticos de calvária (5milímetros) foram utilizados como modelo. O defeito foi escaneado (video 1) e então a bioimpressão intraoperatória foi realizada. O tempo total, para bioimprimir as camadas ósseas e da epiderme, não passou de 35 minutos!
Video 1. Lesão sendo escaneada para que a deposição das biotintas possa ser feita de forma assertiva.
A equipe realizou o procedimento em mais de 50 lesões, atingindo 80% de reparo do tecido mole em 10 dias e com a taxa de reparo ósseo atingindo 80% em 6 semanas (Fig 2). A equipe, liderada pelo pesquisador Ibrahim Ozbolat, que atualmente é a referência mundial nesse tipo de técnica, pretende prosseguir com mais experimentos, validando e aprimorando a técnica, para que futuramente essa possa se tornar uma realidade clínica.
Referência:
MONCAL, Kazim K.; GUDAPATI, Hemanth; GODZIK, Kevin P.; HEO, Dong N.; KANG, Youngnam; RIZK, Elias; RAVNIC, Dino J.; WEE, Hwabok; PEPLEY, David F.; OZBOLAT, Veli. Intra‐Operative Bioprinting of Hard, Soft, and Hard/Soft Composite Tissues for Craniomaxillofacial Reconstruction. Advanced Functional Materials, [S.L.], v. 31, n. 29, p. 2010858, 22 abr. 2021. Wiley. http://dx.doi.org/10.1002/adfm.202010858.
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